O Brasil vive intensas discussões sobre a questão do meio ambiente e como preservá-lo. Uma luta de quase 10 anos está acontecendo no Quilombo da Fazenda tendo o tema meio ambiente e cultura como cenário e como atores o Poder Público Estadual e os quilombolas. Localizado no litoral norte paulista, no município de Ubatuba, o Quilombo da Fazenda teve seu reconhecimento publicado pela Fundação Cultural Palmares em Diário Oficial da União no dia 20 de janeiro de 2006. Desde então o processo de Titulação vem se arrastando pelas salas e gavetas da burocracia paulista criando um clima de constrangimento e agora obrigando o Ministério Público Federal a intervir para que o órgão estadual faça a sua parte com eficiência e impessoalidade, dentro da legalidade exigida.
O território do Quilombo da Fazenda foi sobreposto pelo Parque Estadual da Serra do Mar que é administrado pela Fundação para a Conservação e a Produção Florestal do Estado de São Paulo – Fundação Florestal, órgão vinculado à Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo. O Parque Estadual da Serra do Mar, criado em 1977, teve sua área ampliada em 2010 de 315.000 hectares para 332.00 hectares. Abrange 23 municípios, vai de Ubatuba até Pedro de Toledo, e é considerada a maior área de proteção integral da Mata Atlântica. Hoje muitos pesquisadores e ativistas da causa ambiental reconhecem que essa área protegida por lei, só existe porque as comunidades tradicionais como os quilombolas, mantém dentro do seu modo de vida, o respeito ao bioma onde vivem, defendendo o direito de permanência dessas populações em seus territórios de origem, ao contrário dos conservacionistas que entendem que os parques ou unidades de conservação, não devem ter a presença humana, ignorando a importância dessa relação na preservação da cultura e da natureza.
Para a liderança quilombola Laura de Jesus Braga, a Laura da Fazenda, a atitude da Fundação Florestal já pode ser caracterizada como descaso. “Temos certeza de que não é do interesse da fundação regularizar o nosso quilombo. A comunidade, pressionada pela Fundação Florestal, abriu mão de grande parte do seu território, para tentar agilizar o processo, mas estamos chegando ao final de 2014 e não conseguimos a desafetação do território quilombola do Pq Estadual da Serra do Mar", explica Laura. O processo de titulação do Quilombo da Fazenda, passa por dois órgãos estaduais: a Fundação Florestal e a Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo "José Gomes da Silva", o ITESP. O ITESP finalizou em março de 2007 o relatório técnico-científico que conclui que "urge a regularização fundiária do território quilombola para assegurar o direito da comunidade ao livre acesso aos recursos naturais de que sempre dispuseram, respeitando-se a legislação ambiental". Desde então a comunidade aguarda pacientemente pelo “nada a opor” da Fundação Florestal.
A gota d'água dessa omissão aconteceu no dia 17 de setembro de 2014. Após o convite da própria Fundação Florestal para uma reunião da Câmara Técnica do Conselho do Parque Estadual da Serra do Mar, os funcionários do órgão estadual percebendo a mobilização da comunidade com instituições como a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Ministério Público Federal, o ITESP, o INCRA e as secretarias municipais de Meio Ambiente e da Ação e Cidadania, cancelaram a reunião a menos de 24h da sua realização. Os comunitários mantiveram o encontro, onde foi confirmado o apoio dos presentes à Comunidade do Quilombo da Fazenda.
A reunião foi realizada e a presença da Procuradora da República, Dra. Maria Rezende Capucci, renova a esperança do povo do Quilombo da Fazenda, quando ela declara que “a atividade quilombola tem preservado essa região há 300 anos e que na verdade a unidade de conservação é que está sobreposta à comunidade”. Firmou o compromisso do MPF em agendar uma reunião com a Fundação Florestal com o objetivo de mediar e acompanhar os encaminhamentos relacionados ao caso, esclarecendo que o Ministério Público “tem em sua principal função fiscalizar se os entes públicos estão cumprindo o seu trabalho e estava claro que procrastinação estava sendo praticada pela fundação estadual”, garantindo assim, maior equilíbrio na relação da comunidade do Quilombo da Fazenda com Poder Público Estadual. Para Laura da Fazenda esse encontro foi um importante passo na direção da desafetação do Quilombo da Fazenda do Parque Estadual da Serra do Mar, e assim obter a Titulação do Quilombo da Fazenda junto ao Incra. “A Fundação Florestal tem agido de forma desequilibrada. A presença e a explicação dos procuradores criou uma sensação de equilíbrio nesse processo”.
Por Comunicação Fórum de Comunidades Tradicionais